OpenStreetMap

Reúno aqui um conjunto de reflexões avulsas sobre o mapeamento do património português classificado, mormente arquitectónico, no OSM; algumas lacunas detectadas e outras tantas propostas de melhoria/uniformização de critérios. Por facilidade, a exposição reparte-se em 8 (oito) alíneas. As sugestões de procedimento estão diferenciadas com fiundo verde.


A) COMO LIDAR COM A PLURALIDADE DE SÍTIOS DE REFERÊNCIA?

Como é sabido, temos em Portugal pelo menos três bases de dados de entidades públicas em matéria de Património imóvel, cada qual com as suas particularidades. A saber:

1 – DGPC - Direcão Geral do Património Cultural (5737 registos) - http://www.patrimoniocultural.gov.pt/pt/

  • Focada no processo formal de classificação, mantém os dados mais actualizados relativamente ao trâmites e legislação aplicável em cada caso.
  • É bastante mais consistente do que o SIPA na classificação da informação (pese embora os KITs Património, originais do IGESPAR). Tem um reduzido número de categorias – mormente “Situação Actual” e “Categoria de Protecção” - em que reparte coerentemente cada registo. No SIPA a informação foi notoriamente introduzida de forma aberta, mediante redacção manual, por distintas pessoas, ao longo dos anos – está, por conseguinte, sujeita a nomenclaturas variadas e também a maior número de imprecisões.
  • A DGPC é a melhor fonte para informação sobre (seguindo a convenção, “Campo DGPC -> key equivalente no OSM”):
    • "Categoria de Protecção" -> heritage (níveis 1,2 e 7)
    • "Categoria de Protecção" -> heritage:ref
    • "Situação Actual" -> site_status
    • Em contrapartida a base de dados DGPC é substancialmente mais lacónica quanto às classificações do património local (promovidas pelas câmaras) e totalmente omissa quanto ao regional (promovido pelas entidades dos governos autónomos dos Açores e da Madeira).

2 – SIPA – Sistema de Informação para o Património Arquitectónico (34357 registos) -  http://www.monumentos.gov.pt

3 – Portal do Arqueólogo (34605 registos) - http://arqueologia.patrimoniocultural.pt/

Fonte dilecta mormente em matéria de historic=archeological_site e derivados, fornecendo, melhor do que os outros, detalhes preciosos sobre as intervenções realizadas e o “Período” -> historic:civilization -> historic:period -> historic:era et cetera...

Assim, atendendo ainda a que:

  • 2 e 3 fornecem referências passíveis de identificar cada objecto individual ("Número IPA" e "CNS" – Código Nacional de Sítio, respectivamente).
  • A presença dessas referências (identificadores únicos), bem como de ligações (urls) para as respectivas páginas com os detalhes de enquadramento histórico, é importante não só para organização do trabalho; para referência do utilizador final que procura fontes para se documentar e comprender os locais, como, finalmente, e não menos importante, para assegurar, se for caso disso, a possibilidade de benefício do trabalho dos colaboradores do OSM para melhoria das fontes públicas (não sendo incomum constatar-se que as localizações do OSM são mais precisas e diferem substancialmente das oficiosas - por vezes meras aproximações grosseiras).

Prefigura-se, finalmente, para o que nos interessa, um cenário em que, no limite, se quisermos incluir um imóvel com o máximo de completude, será possível encontrar casos com até 5 (cinco) urls (sendo património mundial, estando presente nos 3 inventários oficiais e possuindo ainda uma página própria, independente deles – e.g. sendo coincidentemente um Museu aberto ao público…) e 2 (dois) identificadores (IPA e CNS).

Colocando-se a questão: como organizar tanta informação de forma coerente e sem atropelo?

A.1 - Proposta de solução para a multiplicidade de urls/websites

Prefixar a key heritage:website com o acrónimo da entidade, excepto no caso da dgpc que se assume como principal fonte de referência, reservando-se para ela, também por questão de compatibilidade e expectativa das aplicações que eventualmente possam consumir os dados, a key básica heritage_website, sem prefixo.

Assim teríamos a possibilidade de coexistência de:
heritage:website:whc=<url no whc.unesco.org>
heritage:website=<url no patrimoniocultural.pt - DGPC> (1)
heritage:website:sipa=<url no monumentos.pt - SIPA> (2)
heritage:website:arqueologia=< url no arqueologia.patrimoniocultural.pt - Portal do Arqueólogo>
website=<url de página própria específica, quando exista, por exemplo com os detalhes de horário, tipicamente mantida pelo operador do monumento>

A.2 - Proposta de solução para a multiplicidade de identificadores únicos:
Discriminar as referências, consoante a fonte, adoptando
ref:whc=<Número no Inventário do Património Mundial UNESCO>
ref:ipa=<Número IPA. Inteiro, expurgado de prefixos e consoante é por exemplo usado no url, após o “=”>
ref:cns=<Número CNS>
ref:dgpc=Opcional, porém útil para o cruzamento dos dados. Correpondente ao número final constante no URL da página de detalhes de cada registo no patrimoniocultural.pt (valor 74178 no exemplo dado nas notas imediatamente a seguir). Trata-se de um identificador artificioso para fim puramente prático.

(1) A forma mais comum de URL é passível de abreviação. Assim:
http://www.patrimoniocultural.gov.pt/pt/patrimonio/patrimonio-imovel/pesquisa-do-patrimonio/classificado-ou-em-vias-de-classificacao/geral/view/74178
funciona igualmente sob a forma, mais curta:
http://patrimoniocultural.pt/pt/patrimonio/pesquisa/geral/patrimonioimovel/detail/74178
(2) Funciona sob, pelo menos, um par de domínios:
http://www.monumentos.gov.pt
http://monumentos.pt
Será conveniente dar preferência ao mais simples: monumentos.pt (segunda fórmula).


B) AUSÊNCIA DO NÍVEL 4 (PATRIMÓNIO CLASSIFICADO PELOS GOVERNOS REGIONAIS)

Constata-se a existência de algumas dezenas de ocorrências (para exemplos consulte-se o monumentos.pt - em "pesquisa avançada") recaindo numa categoria não contemplada na documentação do original da key heritage no OSM. Trata-se de património classificado pelas entidades das regiões autónomas.

B.1 - Proposta de solução

Adicionar à documentação o nível:

Imóvel de Interesse Regional
heritage=4

  • heritage:ref=
    • CAVR - Conjunto Arquitetónico de Valor Regional
    • CCIP - Conjunto Classificado de Interesse Público
    • VCL - Valor Cultural Local
    • VR - Valor Regional

C) AMBIGUIDADE QUANTO AO CONTEÚDO (VALOR) DO HERITAGE:REF

A laconicidade da documentação suscita dúvida quanto a se o valor se deve limitar apenas ao acrónimo (forma abreviada – por exemplo, "MN") ou se se deve incluir simultaneamente este e a sua forma por extenso, separados por um travessão (por exemplo "MN – Monumento Nacional")?

Do estrito ponto de vista da base de dados que é o OSM a redução ao acrónimo é preferível. Já do ponto de vista do utilizador final (por exemplo ao consultar os detalhes do objecto no openstreetmap.org) a forma completa resulta mais facilmente inteligível.

C.1 - Proposta de solução:

Separar a abreviatura e a respectiva forma longa em campos/keys distintos:

  • Manter, como elemento mínimo e legado retrocompatível heritage:ref=ABREVIATURA (ex.: MN)
  • Acrescentar facultativamente a key protection_title=FORMA POR EXTENSO (ex.: Monumento Nacional)

D) AMBIGUIDADE NO USO DOS VALORES HERITAGE=NO E HERITAGE=YES

D..1 - Sugestão de desambiguação

heritage=no
Reservado aqueles casos presentes no inventário dos sítios supra, porém não sujeitos a protecção legal (processos dados como arquivados ou caducados)

heritage=yes
Deve ser evitado e não faz normalmente sentido. Se é “sim” (classificado) tem que ter um heritage:ref com a categoria respectiva.
Só se concebe nos casos em que:
- funciona como mnemónica temporária (o utilizador está com pressa e prefere preencher o valor mais tarde);
- o processo de classificação foi iniciado, porém ainda não foi definida a categoria a atribuir (ver a alínea seguinte).


E) CASOS DO PATRIMÓNIO COM PROCESSO DE CLASSIFICAÇÃO A DECORRER

Nos casos com homologação ou em vias de classificação com estatuto especifico já designado/atribuído deveria adicionar-se as keys heritage e heritage:ref com os valores homologados, adicionando ainda o campo site_status (veja-se a segunda tabela, infra) para os diferenciar,

Assim, tudo somado, com base na DGPC, teríamos as seguintes "tabelas de equivalências":

"Categoria de Proteccão" (consoante a DGPC) heritage heritage:ref protection_title site_status
Classificado como CIM - Conjunto de Interesse Municipal 7 CIM Conjunto de Interesse Municipal ver tabela seguinte
Classificado como CIP - Conjunto de Interesse Público 2 CIP Conjunto de Interesse Público
Classificado como IIP - Imóvel de Interesse Público 2 IIP Imóvel de Interesse Público
Classificado como IM - Interesse Municipal 7 IM Interesse Municipal
Classificado como MIM - Monumento de Interesse Municipal 7 MIM Monumento de Interesse Municipal
Classificado como MIP - Monumento de Interesse Público 2 MIP Monumento de Interesse Público
Classificado como MN - Monumento Nacional 2 MN Monumento Nacional
Classificado como SIM - Sítio de Interesse Municipal 7 SIM Sítio de Interesse Municipal
Classificado como SIP - Sítio de Interesse Público 2 SIP Sítio de Interesse Público
Em Vias de Classificação (com Despacho de Abertura) yes
Em Vias de Classificação (Homologado como IIP -... 2 IIP Imóvel de Interesse Público
Em Vias de Classificação (Homologado como IM -... 2 IM Interesse Municipal
Em Vias de Classificação (Homologado como MN -... 2 MN Monumento Nacional
Em Vias de Classificação para CIM - Conjunto... 7 CIM Conjunto de Interesse Municipal
Em Vias de Classificação para IM - Interesse... 7 IM  Interesse Municipal
Em Vias de Classificação para MIM - Monumento... 7 MIM Monumento de Interesse Municipal
Em Vias de Classificação para SIM - Sítio... 7 SIM Sítio de Interesse Municipal
Não aplicável no
Procedimento encerrado / arquivado (processo individual). Abrangido em… no (*)

(*) Quase sempre, excepto 5 casos integrados em conjunto com protecção.

site_status=
"Situação Actual" (consoante a DGPC), um de:
heritage=
Classificado 1,2,4 ou 7 consoante a categoria de protecção.
Desclassificado - sem protecção legal no
Em Estudo - sem protecção legal no
Em Estudo com Despacho de Abertura - sem... no
Em Vias de Classificação 1,2,4 ou 7 consoante a categoria de protecção.
Integrado em conjunto com protecção legal yes
Procedimento caducado - sem protecção legal no
Procedimento encerrado / arquivado - sem protecção legal no
Sem protecção legal no

F) NECESSIDADE DE CLARIFICAÇÃO DOS USOS DE heritage:since, inscription_date e start_date

heritage:since= Data do diploma que promulga a classificação do património.

O seu uso está generalizado e não faz muito sentido mudar.

Ainda assim, nos casos em que se regista uma dupla inscrição (como é o caso do património mundial) este tag pode coexistir com:
whc: inscription_date=<Data de inscrição pela UNESCO>.

start_date=
A documentação entra em conflito.
Na lógica da classificação do objecto histórico https://wiki.openstreetmap.org/wiki/Key:historic:civilization sugere que start_date é o ano de construção;
já na lógica da classificação do património protegido https://wiki.openstreetmap.org/wiki/Tag:boundary%3Dprotected_area sugere que é a data do início da protecção.

Atendendo a que ambas as classificações tendem a coexistir num mesmo objecto (os alvos de protecção têm quase sempre significado histórico), é melhor optar pela primeira definição, reservando start_date para o momento da construção.


G): ABUSO DA APLICAÇÃO INDIFERENCIADA DA KEY leisure=nature_reserve AO PATRIMÓNIO HISTÓRICO

Dado que o estilo mapnik empregue na geração do sítio openstreetmap.org (carto) não contempla (isto é omite) a reprodução de linhas (boundaries) relativamente a património alvo de outra protecção que não a identificada com a key leisure=nature_reseve ("protected area of importance for wildlife, flora, fauna or features of geological or other special interest") esta é frequentemente usada, ainda que com prejuízo do rigor, de forma indiferenciada, com base num critério compreensível, porém eminentemente cosmético (a vontade de gerar uma linha em torno do objecto).

No mínimo convém sempre diferenciar os objectos em que se protegem os valores naturais (Paisagem Protegida, Reserva Natural etc...) daqueles em que se protege a importância histórico-cultural, adoptando e acrescentando sempre a key protect_class - para os segundos, quase sempre com o valor 22 (activos culturais).


H) COMO PROCEDER À CATEGORIZAÇÂO DAS ZONAS DE PROTECÇÂO ESPECIAL (A IMÓVEL/PATRIMÓNIO EDIFICADO)?

Quando necessário discriminar níveis de protecção diferenciada para um mesmo sítio (eg. "zona de protecção parcial", "zona não edificável", "zona de protecção complementar"...), a documentação OSM sugere que se desenhem múltiplos perimetros (boundaries), aplicando-lhes “site_zone”diferenciadas e articulando-os depois numa relação.

Os detalhes permanecem todavia uma zona algo cinzenta. Mormente seria conveniente definir, face à legislação portuguesa, quais os valores possíveis e como os referenciar (estabelecendo uma equivalência numérica - eg. do maior nível de protecção para o menor?; adoptando uma abreviatura?).

Discussion

Comment from Filohipo on 8 April 2019 at 13:40

Boa tarde. Vou colocar parte deste texto e o respectivo no Talk-pt, Local onde me parece que também devia estar, apesar do fraco movimento. Topolusitania

Comment from ViriatoLusitano on 8 April 2019 at 19:32

Obrigado pela partilha.

Comment from Reino Baptista on 14 April 2019 at 14:39

Caro hvalentim,

Li com muita atenção esta tua proposta que acho fantástica.

Gostava de propor dois pequenos retoques cosméticos:

A.1 heritage:website:dgpc=<url no patrimoniocultural.pt - DGPC> heritage:website:arqueologia=< url no arqueologia.patrimoniocultural.pt - Portal do Arqueólogo>

Da minha experiência no mapeamento de património gosta de salientar a importância de também vir existir um preset (para o JOSM) que acompanhe toda esta doutrina.

Sugiro que a próxima fase seja a elaboração de uma proposta oficial baseada nas “sugestões de procedimento diferenciadas com fundo verde”. Gostaria de ver esta proposta avançar para eu próprio poder retomar os meus contributos que entretanto suspendi. Utilizo frequentemente um preset feito por mim que irei adaptar para realizar testes assim que houver uma concretização da proposta.

Obrigado pelo contributo.

Comment from hvalentim on 15 April 2019 at 10:42

Ora, bom dia! Agradeço o vosso feedback.

Relativamente aos retoques sugeridos pelo Reino Baptista - de resto, provavelmente quem mais trabalho tem produzido dentro do tópico:

  • "heritage:website:arqueologia=" fica mais claro. Concordo.
  • "heritage:website:dgpc=" Pessoalmente também prefiro, no entanto interrogo-me se não era capaz de ser útil manter um heritage:website sem prefixo, para não fugir muito à regra?
  • relativamente à questão do preset. É sem dúvida útil, até porque com tanta key desenvolve-se uma certa tendência para as confundir (por exemplo se a separação é com : ou com _). Será possível publicá-lo de modo a ficar acessível a todos? Talvez no wiki do Josm ou no Github?

Log in to leave a comment