OpenStreetMap

Quem faz o mapa e quem usa o mapa? Esta distinção deve ser o “ponto de partida” de uma “rota” em busca do “mapa ideal”.

Afinal, é possível produzir mapas que representem todos os lugares com equidade? Para responder essa questão contemporânea, Boaventura de Souza Santos, em seu artigo Uma cartografia simbólica das representações sociais: prolegômenos a uma concepção pós-moderna do direito, já sinalizava, em 1988, sobre a relevância da espacialidade na interpretação temporal e o papel dos mapas para o direito histórico aos territórios, e aponta, em síntese, três aspectos para investigação crítica a partir de uma cartografia: 1) a escala, 2) a planificação e 3) a simbolização.

A escala, a planificação e a simbolização são recursos-chave para o funcionamento dos mapas que utilizamos via Internet, e que, por vezes, levam o usuário do mapa à refletir sobre os critérios de relevância e as regulações que garantem a organização das informações que ele acessa sem reconhecer quem produz os mapas utilizados. Afinal, quando falamos em mapas para todos precisamos também perguntar: Quem são “todos”? Usuários ou produtores de mapas? Quais são os mapas que representam “todos” por “todos”? Google Maps ou OpenStreetMap?

O Google Maps é uma plataforma — um site que reúne dados e permite operações online — de uma empresa hegemônica (holding) nas práticas de geocomunicação, formada por uma complexa trama de incorporações de empresas (subsidiárias), um dos produtos mais evoluídos da Indústria das Mídias, lançado em 2005.

Isso porque, diferentes inovações, no âmbito das operações de produção e circulação — como o Local Guides e o StreetView — tem sido marcada pelas apropriações sociotécnicas de geotecnologias a partir da “geospacial web” (ou geoweb), ambiente digital decorrente da convergência da interatividade da web 2.0 com as frequências de GPS (Geographic Positioning System) e a base de dados de GIS (Geographic Information System).

O OpenStreetMap também é uma plataforma, criada para servir às práticas alternativas de geocomunicação. A distinção elementar do OpenStreetMap, lançado em 2004, é que este não tem fins lucrativos, é um projeto colaborativo mantido por doações e realizado por voluntários. Neste modelo de negócio, novas modalidades de economia das redes digitais entram em cena, em conflito com o monopólio das organizações com fins lucrativos, como a Google Inc. Considera-se que os mapas online são ultracolaborativos (pois permitem colaborações em massa e/ou em rede), hipervisuais (pois permitem visualizações por escalas gráficas diversas, do zoom micro ao zoom macro) e multiterritoriais (por permitirem territorializações pelo conhecimento e pelo reconhecimento, do senso de “estar na cidade” e “ser da cidade”). Estas “dicotomias tricotomizadas” (nos termos de Henri Lefebvre) conduzem ao “paradigma das geocomunicações”.

Esse paradigma fundamenta-se no pressuposto de “quem necessita do mapa” Apesar da globalização dos mapas com a Internet, são os sujeitos habitantes que, por sua vivência e percepções, possuem maiores e melhores condições de comunicabilidade de localizações e trajetos na representação cartográfica de um território. Isto é, de fornecer informações espaciais a um sistema de geocomunicação (uma das plataformas de mapas online), de modo a suprir a demanda de sujeitos estrangeiros, que não partilham com os habitantes os referenciais de pertencimento à paisagem visual e/ou sonora deste território.

O ato de “empoderar” habitantes no processo de colaboração, na produção de mapas de um território, concebe outras representações para além das colaborações de visitantes, conforme o “paradigma das geocomunicações”, para o qual as três dimensões do espaço (vivido, percebido e concebido) “constituem uma unidade dialética contraditória”. É o sujeito habitante, dotado da liberdade de comunicação virtual que deve consentir, entre usar e aprimorar mapas sob a licença do OpenStreetMap ou do Google Maps, ou seja, consentir sobre qual mapeamento melhor representa a realidade do seu espaço vivido: com base na ação cartográfica ou na atividade cartográfica.

Em síntese, afirmamos que ocupar o corpo na ação colaborativa de mapeamento representa um gesto político, se reconhecermos que o direito à cidade é o direito ao mapa: como propõe Boaventura de Souza Santos, os mapas são simbolicamente os “prolegômenos do direito”.

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